O que já aprendemos com a pandemia

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Criado proposital ou acidentalmente e nascido na China no final de 2019, o Coronavírus, ou Covid 19, é um microrganismo que, para sobreviver por mais tempo, precisa se hospedar em seres vivos. 

Em poucos meses, o Covid 19 paralisou o planeta Terra, causando alterações profundas em nossos hábitos de vida (e em nosso estado de espírito), em nossas instituições públicas e privadas e nas estruturas de governo e de governança, no equilíbrio das relações entre nações e, também, na maneira como a humanidade, doravante, viverá em sociedade. 

O mundo foi tomado de surpresa pela virulência e rapidez na propagação desse microrganismo. A China providenciou a quarentena quase imediata da numerosa população da metrópole de Wuhan, berço da pandemia, no que foi seguida por quase todos os países, embora em graus variados de confinamento. A humanidade se viu confrontada com novos conceitos: por exemplo, o do confinamento vertical, do confinamento horizontal, ou do abrandamento da curva de contaminação. 

Por ser o berço do Covid 19, a China, certamente, sofrerá consequências indesejadas ao seu propósito estratégico de ser fornecedor único ou quase monopolista de muitos dos produtos manufaturados consumidos mundo afora. Os países se deram conta de que a dependência econômica da China, em alto grau, poderá ser fatal às suas economias. Nesse contexto, vale lembrar que a China, que se caracteriza como nação comunista, administrada por um regime capitalista de Estado, vem comprando empresas mundo afora, o que vem alterando os pesos econômicos e geopolíticos no tabuleiro das nações. Por exemplo, a fabricante sueca de veículos, a Volvo, hoje, pertence à China, que, no setor automobilístico, ainda detém 30% do capital da alemã Daimler-Benz, a fabricante dos veículos Mercedes-Benz, e uns 12% da PSA francesa, que reúne as marcas Citroën, Peugeot e Opel. Diante dessa realidade revelada pela pandemia, o governo alemão já vetou a aquisição pela China de uma empresa alemã, uma decisão que deverá ser bem atraente para governos de outros países.

A China, que é detentora de uns 70% dos títulos da dívida pública dos EUA e vem despontando como a principal rival da (ainda) atual nação líder do mundo, na pandemia, escancarou sua estratégia de crescente neocolonialismo e de fornecedor quase monopolista de produtos para o mundo todo. Por esse conjunto de circunstâncias, a China é vista como a vilã da pandemia e prevejo que haverá retaliações e ajustes nas relações entre ela e os demais países que ela ainda não domina economicamente. Alguns países já anunciaram ações indenizatórias contra os chineses em tribunais internacionais. 

Obrigados a seguir o exemplo chinês do imediato confinamento mais abrangente possível de suas populações, os países se viram diante da inusitada necessidade de assegurar a preservação da saúde dessas populações, minimizando a taxa de mortalidade e atenuando a taxa de contágio, ao mesmo tempo planejando e implementando políticas de emprego e renda e de preservação de empresas em todos os setores da economia, sendo que não havia referências históricas pregressas em que se inspirar. Resultou exaltado o papel intervencionista do Estado, que, em alguns países, deu-se às custas da perda parcial de direitos individuais e do relaxamento ou abdicação de políticas econômicas neoliberais (exemplo bem marcante: a Hungria, cujo presidente recebeu do parlamento poderes praticamente ditatoriais). Esse papel intervencionista dos governos representou, e representará, um dreno financeiro bilionário que onerará os países por décadas. 

A ocorrência da pandemia do Covid 19, reformatará os mais diversos setores da economia. Na indústria manufatureira se intensificará a automação de processos fabris e de logística, com a crescente utilização da ameaçadora inteligência artificial e a consequente redução da presença humana. Inúmeras atividades profissionais serão eliminadas, substituídas por robôs. Os setores de serviços da economia poderão perpetuar o trabalho de seus profissionais para ser realizado em casa e não mais em um escritório aglomerando as pessoas. Outras atividades profissionais sairão da pandemia reforçadas na sua essência: médicos, enfermeiros e demais profissionais da saúde. Haverá uma prioridade política para implantar sistemas hospitalares tecnologicamente atualizados e que atendam à maioria, senão a totalidade das populações. As atividades escolares e acadêmicas poderão migrar para o método EAD (Ensino a Distância), de custo operacional menor, tanto para as instituições quanto para os alunos, mas que exigirá novos perfis profissionais dos instrutores/professores. As grades escolares precisarão ser revistas para adequar a formação escolar das pessoas às novas profissões que existirão.

A redução da presença humana se refletirá em todas as áreas da vida social, seja em escolas, restaurantes, cinemas, estádios esportivos, igrejas e templos, e nos meios de transporte de massa, como trens, ônibus e aviões. O distanciamento seguro entre pessoas tenderá a se tornar a regra geral e a encarecer os serviços prestados nesses meios. A frequência de viagens turísticas diminuirá e largos contingentes de pessoas farão viagens virtuais pela internet. O trânsito urbano de veículos em uso de conveniência também diminuirá e aumentará grandemente o comércio eletrônico e a entrega em domicílio de produtos e serviços, inclusive de alimentos. Diminuirá gradativamente a importância de shopping centers e de lojas atacadistas e varejistas. 

O Covid 19 nos fez refletir sobre a essência da vida. Fez-nos rever nossos valores, nossos objetivos, nossas ambições. A corrida de ratos em busca de riqueza material parou (ao menos até que se descubra uma vacina ou outro remédio eficaz). A mãe Natureza respirou aliviada: menos poluição e uma calmaria na convivência humana com a fauna e a flora. 

Reavaliamos a fragilidade da nossa vida. Descobrimos ou redescobrimos a importância da família e das relações familiares, tão drasticamente prejudicadas pela nossa vivência nas, e adicção às, redes sociais. Ainda assim, a internet se tornou ferramenta essencial para neutralizar a solidão que vem com o confinamento obrigatório. Pela internet, podemos ver e falar com entes queridos que não podemos visitar. Pais e filhos menores precisaram aprender a conviver em regime de 16 horas úteis por dia, um desafio agravado pelos papéis novos delegados aos pais: de instrutores escolares de seus filhos, de serviçais domésticos, enquanto, em muitos casos, ainda são obrigados a, simultaneamente, exercer suas atividades profissionais a partir de casa. 

O isolamento social involuntário de um indivíduo constitui uma violência mental, que, em situações extremas, pode levar à loucura. O isolamento imposto à humanidade em decorrência da pandemia do Covid 19 resulta em graus variados de sofrimento mental, dependendo do número de pessoas no ambiente de confinamento. Depende de o indivíduo estar só, ou acompanhado de seu cônjuge, filhos, ou de algum parente ou amigo. Depende, também, do rigor do confinamento. Por exemplo, as pessoas podem andar ao ar livre se mantiverem distância segura, evitarem aglomerações e usarem máscaras faciais? 

Na medida em que o tempo de isolamento se estender por prazo indeterminado, as pessoas tendem a sofrer de ansiedade, fobias e até de hipocondria, especialmente quando a pessoa estiver só. Quando uma pessoa estiver confinada em um grupo familiar ou social, tende a ocorrer um aumento da agressividade, da irritabilidade e da intolerância, e poderá haver violência verbal ou física. Casamentos poderão ser desfeitos. 

Mas, existem mecanismos para amenizar ou até eliminar o sofrimento. O mais importante é criar uma rotina individual de atividades (realizar tarefas domésticas, fazer jardinagem, pintura artística, ler livros, assistir a filmes, fazer cursos a distância, relacionar-se socialmente pelas redes sociais, distrair-se com jogos eletrônicos ou de tabuleiro e socializar com os parceiros de confinamento). Essa rotina individual precisa ser harmoniosa com a rotina dos demais participantes do confinamento. É preciso respeitar a individualidade e a privacidade de cada um. É preciso alimentar-se saudavelmente, dormir bem, exercitar o corpo e tomar banho de sol sempre que possível. É preciso imunizar-se contra o bombardeio diário de notícias negativas. Quando acabar a pandemia e houver a existência de uma nova rotina, bastante mais “doméstica”, será preciso encampar esse novo know-how de como viver a vida.

Como falar com crianças

 

Nascemos dotados de duas orelhas e uma só boca, mas, na prática, usamos a boca para falar, muito mais do que os dois ouvidos que temos.

Muitos dos problemas emocionais que temos resultam desse fato. A maioria das pessoas não tem “ouvidos” para o que outras pessoas têm a dizer. Ficamos impacientes para impor os nossos pensamentos, a nossa opinião aos outros e até a nós mesmos.

A maioria das pessoas não aprende a “ouvir” o que é dito externamente, para então poder ouvir os seus pensamentos internos. Significa saber meditar, refletir e decidir depois de analisar. Significa ouvir-se.

Na era eletrônica em que vivemos, somos consumidores vorazes da avalanche diária de informações que nos chegam pela mídia social. Muitos de nós, que já sofrem de adicção eletrônica, carecem de tempo e paciência para dialogar.

A totalidade da humanidade convive socialmente com outras pessoas. Algumas pessoas mais, outras menos. A quase totalidade da humanidade é pai ou mãe de filhos.

E como anda a comunicação com os filhos nessa era de pouco tempo disponível? Quantos pais e mães estão sabendo dialogar com os seus filhos, sabendo educá-los para a vida, pois essa função não cabe às escolas, cuja finalidade é principalmente transmitir conhecimento de assuntos específicos. A personalidade é moldada em casa, não na escola. A responsabilidade paternal/maternal não deve ser terceirizada para as redes sociais. Aliás, é salutar privar a criança menor de 10 anos do contato intenso com a internet. Estabelecer um tempo máximo por dia e encontrar um método de monitorar o conteúdo acessado. Melhor ainda é presentear um filho com um instrumento musical que possa aprender a tocar (Mozart deu seu primeiro concerto musical aos 5 anos de idade).

Portanto, é preciso saber falar com os filhos e com as crianças em geral.

O primeiro requisito é: tratar a criança como pessoa integral, que tudo entenderá se lhe for falado em linguagem que compreenda.

Posicionar-se de modo a olhar a criança nos olhos, em ângulo paralelo. Agachar-se se for necessário ou pegar a criança no colo ou nos braços se a idade dela e as circunstâncias sociais o permitirem.

Estabelecer empatia. Chamar a criança pelo nome. Não levantar o tom da voz. Nunca gritar com uma criança. Conquistar a atenção da criança para o que tenha a dizer a ela ou para ouvir o que ela tenha para dizer ao adulto.

Falar o essencial, de modo breve e simples. Quer saber se a criança entendeu? Pedir-lhe para reproduzir com suas próprias palavras o que lhe foi dito. Se ela não tiver entendido, não a censurar ou criticar. Será o adulto que não terá sido eficaz na comunicação.

Ser positivo. Por exemplo: a criança está correndo dentro de casa e o adulto não quer isso: ao invés de impor uma proibição, estabelecer uma contrapartida: “em casa andamos e lá fora você pode correr à vontade”. Outro exemplo: o adulto quer que a criança se vista: ao invés de dar a ordem: “vista-se” ou melhor, “vista-se por favor”, diga-lhe: “vista-se para você depois poder ir lá fora e brincar”.

Use a palavra “quando” ao invés de “se”: “Quando você tiver escovado os seus dentes, assistiremos ao filme” ao invés de “se você não tiver escovado os seus dentes, não assistiremos ao filme”. Positivo e não negativo.

Pedir ao invés de ordenar: “gostaria que você fosse pontual” ou “por favor, seja pontual” ao invés de “seja pontual” dito enfaticamente.

Envolver a criança no planejamento de ações: suponhamos que o adulto esteja planejando uma viagem da família no fim de semana: perguntar à criança o que ela acha da ideia. Pedir a opinião dela, mas estar preparado para o caso da ideia dela ser diferente da do adulto: então, o adulto precisará negociar para chegar ao consenso da maioria (supondo que há outros familiares participando da conversa). Se houver apenas o adulto e a criança e a ideia dela divergir da do adulto, negociar uma alternância: “ok, esta semana vamos ficar em casa porque você (a criança) prefere ir assistir a uma partida de futebol”. Em troca, a criança se compromete a acompanhar o adulto na viagem em outra ocasião.

Haverá situações não negociáveis, porque isso envolverá estabelecer limites. Ainda assim, fazer um esforço muito grande para convencer a criança quanto à necessidade de impor aquele limite. A imposição será aceita pela criança quando ela entender sua lógica. Evitar estabelecer limites apenas por um capricho do adulto. Isto será um convite à burla, à transgressão e à omissão de feedback ao pai ou adulto e poderá resultar em alienação parental. Se a criança não confiar nos pais ou adulto ou tiver medo deles, ela buscará compreensão fora de casa, muitas vezes nas rodas dos traficantes que vendem drogas para consolá-la. E desvencilhar-se das drogas é algo reservado a poucos.

Em havendo infração a limites estabelecidos, a criança deve, sim, ser punida. Nunca deverá ser um castigo físico, mas a punição deverá causar incômodo emocional à criança para que haja um aprendizado.

Portanto, uma importante missão na vida de um pai ou de uma mãe é tornar-se confidente de um filho. Ser o seu porto seguro, a quem tudo ou quase tudo possa contar e em troca receber compreensão ou educação corretiva. Para tanto, os pais precisam estar temporalmente disponíveis para os filhos e participar intensamente da vida das crianças até que elas alcancem a maturidade para decidirem sua vida por si mesmas.